Nascemos no alto mar no meio da tempestade
Ali a meio caminho
Entre o cabo das Tormentas
E o céu do Paraíso
A alma mareante
O fogo de San Telmo
O luto o desespero
Pel'alegria breve
De navegar um instante
Um século, uma História
Enquanto fabricamos
No ventre do porão
PaixãoDepois, cuidadosamente
Encheram-te a cabeça
De histórias de aventura
De batalhas de Ourique
Reis mouros esmagados
De heroísmos vários
De feitos de bravura
De mundos viajados
Poemas inflamados
A Grei, Prestes João
O mapa cor de rosa
A virgem aparecida
El-rei D. Sebastião
Um Império Mundial
Caramba!Às vezes perguntámos
Parando por momentos
Num vendaval de Santos conquistas embaixadas
Com coches de ouro ao Papa
Marfim e arrecadas
E a gente sempre a olhar
A olharSentíamos mar nas veias
E febres de partir
Encantos de Medeias
Tentações de fugir
Mas ficámos por cá
Amarrados ao Convento de Mafra
Chorando o desencanto
De ficar que o forte forte vento
Não nos deixava enfim
Nem estradas de sair
Nem estradas de chegar
Nem traços de partir
Nem posses de alcançar
P'ra dentro do futuro
AdianteE tinhas razão que o certo certo mesmo
Podia ser aquilo, podia ser o vento
Podia ser a história, qua há tantas tantas formas
De a gente dar memória
E às vezes o silêncio 'té dizem que é dourado
Mas um homem fica parvo
Com a força do futuro contida no passado
E devotadamente, Aljubarrotamente
Crê!E conformado crendo
Que as nossas aventuras
Só foram pela canela pimenta e especiarias
E só fomos heróis em terras e lonjuras
Por querermos espalhar a Fé e as teorias
Que nunca violámos
Que nunca escravizámos
Nem traço de chicote nem outras judiarias
Nem alma de ladrão morrida nas galés
E ao mar!De 30 em 30 anos
Às vezes mais – 50!
Até acreditamos
Rumamos à tormenta
Batemo-nos e vamos
P´rá liça do futuro
Com a nossa força grande
Antiga
Mas contados p´los dedos
Assuntos bem saldados
Ficaram intenções
Castelos abandonados
Crianças sem saber
O sol pr´os reformados
Remessas de emigrantes
E o mar que eles voltam voltam sempre
Cinzentos sorridentes
Cheirosos influentes
De todos os quadrantes
E por todas as frentes
Com cupidez te amansam
Com polimento avançam
E zásNas grutas de uma vida
Um homem muda tanto
E de criança a velho
E de truão a santo
O salto é tão pequeno
O trilho é tão estreito
Tantos pavores na fronte
Tantos calores no peito
Tanto ouro na corrida
E a força da razão e a força da subida
Mãos quentes de bater
Mãos magras de sangrarem
E quanto mais procuras ou mais te procurarem
Caíste!Tentas saber como é
E tentas aprender
Aprendes a sorrir
Aprendes a esconder
Aprendes a vender
Aprendes a comprar
Aprendes ´té a amar
Assim assim, se tanto,
Desconfiadamente
A engolir o pranto
A não te olhares de frente
Enquanto sonhas longe
Ai tão longe daqui e tão
DiferenteE embarcas pelo deserto
Resolves-te a partir
Juntando três amigos
Sem jeito ao despedir
Duas frases erradas
Não era nada disto
Que eu vos queria dizer pá
Mas vais
E é natural que sintas
Vontade de o fazer
Vontade de viver
Aquilo que não te dão
Para isso tenta a China
O Laos o Alaska a Índia
A Tailândia e o Japão
O Barhein!E rumas na paisagem dominado pela cor
Três trapos p´rá viagem
Um cesto um cobertor
Impostos declarados
A alma decretada
Passaporte conforme
E um pãoE gritas ao silêncio
E vai saber-te bem
Gritar sob os comboios nas pontes quando passam
Ficaram tantos tipos
Olhando pela janela a sua própria vida
Ah tu, tu não!Mas lá longe no deserto
Relembras o teu sítio
Tão longe na distância
No peito ali tão perto
E vem-te à boca o travo
Dessa questão eterna
Do ir ou do voltar
Do ir ou do voltar
E tu? E tu
Composição: Pedro Barroso.
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